sexta-feira, 10 de abril de 2009

3° ATO - Parte II

Ligam-se as luzes e tudo é preto e azul no ambiente. Azul está de costas para a platéia olhando para uma janela. Ele tem um rabo, chifre e máscara demoníaca. Preta está deitada em posição de velório. Tem as mãos e uma vela sobre o peito. Narrador1 está com uma roupa cor de laranja, fuma um charuto e corta o palco dizendo:

Assim, por um bom tempo Azul e Preta
Relacionaram-se. Um vivo a outra morta.
Se Preta é a ausência, azul comporta
A exclusão transformando-se em capeta.


E continua com um tom pausado. Uma gargalhada estranha soa com eco no final da fala.

O céu estava nublado, era o aviso
De que Azul permanecia deprimido,
De que havia falta de seu comprimido.
Agora era alheio, o que antes era riso.


Narrador1 fala e aponta para Anil, que aparece e faz a sua fala:

Até seu primo Anil lhe consolou:
Ó, Primo! Há tantas cores concretas,
Porque logo nessa abstrata obcecas?
Será que no tudo algo lhe faltou?


Azul ouve o primo de cabeça baixa, levanta-se e vai ao encontro das cores Lilás, Laranja e Verde2. Se empolga, mas sai desconsolado, não vê substância nas cores concretas, busca o mistério do seu último amor, Preta. Azul cai em mágoa. O Narrador1 pontua:

Azul o escutou, mas não lhe respondeu.
Secundárias adiante presenciou,
Concretas onde nada ele encontrou.
Sendo aí, seu último amor morreu.


Com cara de quem “você foi avisado”, o Narrador1 vai à platéia se referindo a Azul:

Antes de tudo, Negra lhe avisara.

Preta levanta-se com a vela na mão, tem o rosto com maquiagem gótica, cabelos soltos e parte agressivamente em direção de Azul, com a vela em forma de espada, dizendo:

“Não fazes parte, infeliz, do que eu faço,
Sou a falha em dar êxito para o espaço,
Sendo a presa no instante em que eu caçava!”


Azul coloca um blues totalmente raiz e de lamento num toca-discos. Deita-se e fecha os olhos. O Narrador1 explica:

Azul lembrou do primo americano
Que compunha a música de uma raça,
Onde Negra era filha, a dona da praça,
Que inspirava guitarras e o piano.


Decidiu de imediato esquecê-la.
Como quem tem pão e corta o dedo,
Ou entre o suave e o doce prefere ao azedo.
Fica a se entender para entendê-la.


No quarto, Azul reúne livros, ajeita e liga a televisão, escuta o headfone, cola um poster de Lupicínio Rodrigues, faz tudo ao mesmo tempo. O Narrador1 entrega os livros, os discos, ajuda a carregar a tv, passa-lhe o headfone, enquanto fala:

Certo dia resolveu se enclausurar.
Comprou alguns livros e a televisão.
Assistia aos jornais de primeira mão,
E assim permanecia o dia no pensar.

Quando ouvia o que Lupicínio dizia:
“Clara definição do pensamento.”
Sentia-se um vão, à toa, a todo momento.
Só acordava, pensava e dormia.


Entra um som de rádio sendo sintonizado. Azul pega a cadeira e se aproxima da TV, onde vai mexendo nos botões como se estivesse a acertar a frequência. De repente, ele para e dá um salto. O Narrador1 encerra a fala, tudo é tomado por canhões de luzes vermelhas. Em seguida, tudo se apaga.

E foi consultando sua nobre orelha,
Que escutara uma informação local,
Precisamente no quinto canal.
Tinha certeza, era a mulher – Vermelha.

Fecham-se as cortinas.

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